O injusto vai contra a ordem do que é sensato, porque não pondera, do que é social, porque não é solidário, do que é humano, porque não é humanista.
O injusto
O injusto é ingrato e egocêntrico; e a injustiça é a mãe de todos
os conflitos. Sem justiça não há paz. O injusto não pondera, não
percebe e não observa as ações e a conduta daquele com o qual convive em
seu lar ou fora dele, mesmo se este ente for generoso ou tolerante e
até mesmo, se o for o caso, avesso ao confronto pessoal ou em sociedade.
O injusto, além de ser ingrato, não gosta de ninguém, e demonstra
parte de sua face até então escondida em suas entranhas e dessa forma dá
publicidade ao outro lado de sua personalidade, que, quando em
conflito, em um momento demoníaco, suas palavras brotam como lava a sair
da boca de um vulcão, sem, contudo, preocupar-se com o outro, que
naquele momento se torna alvo de sua ira, do seu ódio e da sua falta de
compreensão sobre aqueles que estão ao seu lado.
O injusto vai contra a ordem do que é sensato, porque não pondera, do
que é social, porque não é solidário, do que é humano, porque não é
humanista. Ele detesta discernir sobre realidades e fatos, porque se
recusa, terminantemente, a pensar nele, nas suas falhas, nos seus erros e
nas suas injustiças. Afinal, ele é injusto; e se for se autoanalisar é
capaz de se considerar injustiçado. E o egocêntrico sempre acha que tem
razão e que nunca erra ou errará, o que, indubitavelmente, favorece
muito a geração de conflitos — desentendimentos.
Ele é egoísta, o que o torna egocêntrico, porque tem o ego centrado
em sua personalidade, em seu caráter, e a ser assim não consegue
compreender o que é justo do que é injusto, porque, por ser injusto,
somente ele sente dor, somente ele é injustiçado e somente ele não é
compreendido, em todas as questões relativas à sua vida, porque sempre,
em qualquer hipótese, o injusto se considera vítima e nunca vitima seu
semelhante. Jamais ele pensa que fez o papel de algoz, porque os outros
que são ruins, incompreensíveis e cruéis. O pensador francês Jean-Paul
Sartre afirmou: "o inferno são os outros"! Jamais o injusto, dentro de
sua redoma de lógica doentia e bipolar, assumirá tal realidade tão bem
esclarecida por Sartre.
Por incrível que pareça, um dos sentimentos do injusto é se sentir
injustiçado, e, para isso, ele finge a dor que não sente, por se tratar
de um ator. Seu espírito está contaminado pelo ódio e pelo desprezo às
pessoas. Ele não gosta de ninguém, mas disfarça a falsidade intrínseca
ao seu caráter com gentilezas e maneirismos tão superficiais quanto a
uma casca de ferida.
O injusto nunca se sente à vontade em sociedade e no lar e por isso
faz pouco dos outros, agride a consciência, a inteligência e a noção do
que é correto ou errado, no que é relativo a uma convivência fraternal e
respeitosa entre as pessoas. Ele não sabe o que é respeito e muito
menos o que é fraternidade. Por ser assim e por se considerar
socialmente superior se torna nocivo àqueles que convivem com ele, que
dependem dele ou que são subordinados no âmbito do seu trabalho, da sua
profissão.
O injusto comete injustiça também com as pessoas que estão ao seu
lado, que o protegem, que o amparam e o ajudam. Ele é tão mesquinho de
sentimentos e autoritário, e por isto injusto, que erra quando está por
cima ou quando está por baixo. Nada importa ao injusto, porque, para
ele, até mesmo sem ter plena consciência dessa razão, o universo é o
centro do seu ego. Por isso, a dificuldade de se analisar, de ponderar,
de discernir, de compreender e de reconhecer suas falhas, seus equívocos
e suas injustiças.
Portanto, quem se sente injustiçado pelo injusto não tem como fazê-lo
entender, porque ele não erra, e, se não erra, não tem como ele
conhecer o sentimento da humildade para pedir perdão e,
conseqüentemente, reconciliar-se com o ofendido, com o injustiçado. O
injusto é a própria patologia. Quando se olha no espelho, enxerga a
imagem da perversidade, que, às vezes, ele detesta, até a reconhece, mas
seu instinto, sua essência e seu caráter não conseguem se livrar de tal
aspecto no que tange à vilania.
Para o injusto detestar, desprezar, desrespeitar alguém não foi e não
é necessário que este ente humano tenha feito mal a ele. O injusto se
torna seu inimigo e o insulta porque, dentro de sua lógica, a insanidade
se torna normalidade, e por isso ele não tem sentimento de culpa, de
modéstia, de perdão ou humildade. O injusto não serve, somente quer ser
servido, e, se servir ou fazer qualquer favorzinho, sente-se explorado,
porque está acostumado a receber e nunca dar, bem como, na primeira
oportunidade que tiver, joga na cara e cobra o favor que fez. O injusto
detesta a oração de São Francisco de Assis, que ensina que "é dando que
se recebe" e que "é perdoando que se é perdoado". Isto está fora de
cogitação.
O injusto quando entra em conflito te acusa, inverte situações, fatos
e verdades, tergiversa sobre as realidades e faz seu oponente sofrer,
ainda mais quando o ofendido tem a plena consciência que está a ser
subestimado, desconsiderado e injustiçado. É terrível. O injusto, mais
cedo ou mais tarde, torna-se, irremediavelmente, cruel. É que ele tem
mania de perseguição. Acredita, piamente, que todo mundo quer ofendê-lo,
cobrá-lo e prejudicá-lo. Desconfiado, pensa que todas as pessoas são
mal intencionadas, e, dessa forma, não mede conseqüências quando utiliza
as palavras e efetiva as ações, e por isso causa dor às pessoas,
sentimento de insatisfação e até mesmo de revolta.
Quando um pai ou uma mãe; um juiz ou um presidente; um policial ou um
professor ou qualquer cidadão cometem injustiças termina a paz e começa
a guerra. Sem justiça não há paz. Sem justiça não há diálogo e nem
perdão. O Injusto torna normal o que é pecado; não sente culpa pela
injustiça — o pecado cometido. Esta conduta é tão natural e intrínseca
ao seu caráter, que de tanto cometer o mesmo pecado, nunca se arrepende,
pois considera o que fez ou o que pensa fazer absolutamente normal.
O injusto é a iniquidade em pessoa, a ferocidade como sua voz e a
perversidade como essência de sua ação social e moral. A ferramenta do
injusto é a injustiça — a mãe da discórdia, da vilania, do sofrimento,
e, consequentemente, da ausência de paz. É isso aí.
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