Todos os dias o policial civil Roberto* faz uma prece silenciosa para
que ele e a sua família não se tornem as próximas vítimas da onda de violência
que aflige o Estado de São Paulo. Desde o início do ano, pelo menos 90
policiais já perderam a vida. Desse total, apenas três estavam em serviço.
"Eu não estou aguentando mais. Estou com um peso nos ombros, não vejo
alternativas surtindo efeito, não vejo melhora. Não tenho com quem conversar,
não temos acompanhamento psicológico. Se falar para a minha família, vou deixá-los
ainda mais preocupados", desabafou o morador do litoral paulista.
Casado e pai de três filhos, Roberto tem mais de 25 anos de carreira,
mas não esconde que a angústia e a insegurança têm o acompanhado nos últimos
meses. "Agora, devido a ousadia e a crueldade dos ataques, e ao fato de
vivermos em um Big Brother, tudo isso vazou, mas isso (as mortes de policiais)
acontece há muito tempo. O governo de São Paulo (PSDB) sempre jogava para
debaixo do tapete e colocava a moral do policial em xeque", criticou.
Roberto sabe muito bem as consequências de se tornar parte das
estatísticas. Em 2006, perdeu um amigo policial nos ataques ocorridos em maio,
quando 493 pessoas foram mortas, entre elas, pelo menos 43 agentes públicos.
"Ele era uma pessoa íntegra, um policial exemplar. Até hoje a família dele
não recebeu o seguro, porque ele estava de folga. Para o governo, o policial só
é policial no horário de serviço", disse.
Na época, a maior parte dos atentados foi promovida pelo Primeiro
Comando da Capital (PCC). E novamente a facção criminosa estaria por trás da
onda de violência. Na visão de Roberto, desta vez o PCC tem utilizado a tática
de guerrilha, que usa artifícios como emboscadas, sabotagens e ataques com
extrema mobilidade, ou ações não convencionais, para debilitar moral e
psicologicamente o adversário e derrotá-lo, como os vietcongues fizeram contra
os Estados Unidos na Guerra do Vietnã (na época, eles tiraram proveito de seu
conhecimento na selva vietnamita e usaram túneis como arma-secreta para derrotar
o poderio bélico norte-americano). "Da mesma forma, o PCC evita
confrontos, aposta em fatos isolados, em atacar os policiais em seu horário de
folga porque isso não faz o governo dar uma resposta imediata. E, assim,
enfraquece a organização policial e causa pânico na população", analisou,
salientando que o grupo está extremamente organizado.
O policial contou que há informações de que a facção quer se tornar
realmente uma força política. "Eles já patrocinam políticos de partidos
menores", afirmou. Segundo Roberto, há uma espécie de "assistência
social" para as famílias dos presos que fazem parte da facção, fornecendo
dinheiro e itens de necessidade aos parentes. Além disso, eles contam com o
trabalho de advogados renomados e, recentemente, começaram a investir na
"intelectualidade" do grupo. "Eles apostam em crianças e jovens
inteligentes e dão educação a eles, para então torná-los advogados e até mesmo
juízes". Dessa forma, o grupo garantiria influência no poder judiciário
brasileiro. "A coisa é muito mais profunda do que se imagina",
completou.
*O nome foi trocado a pedido do entrevistado.
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