A Veja “estimula o reacionarismo ressentido, paranoico e feroz”
Postado em 01 Mar 2014
Algum tempo atrás, meu amigo Sérgio Berezovski, então diretor da 4 Rodas, me contou uma história.
A revista procurara o jornalista Flávio Gomes para ouvi-lo numa determinada reportagem.
Flávio, polidamente, avisou que não falaria com uma empresa cujo
carro-chefe é a Veja. Deixou claro não ter nada, especificamente, contra
a 4 Rodas.
Nesta semana, um episódio da mesma natureza – mas que ganhou ampla
repercussão na internet – mostrou a deterioração da imagem da Veja como
uma publicação séria.
A socióloga Sílvia Viana, procurada para uma reportagem sobre o BBB
14, produziu uma resposta que a posteridade vai poder usar como medida
do repúdio despertado pela Veja depois que se transformou num panfleto
de baixo jornalismo, nos últimos dez anos.
Disse Sílvia a quem pedira a entrevista:
“Respondo seu e-mail pelo respeito que tenho por sua profissão,
bem como pela compreensão das condições precárias às quais o trabalho do
jornalista está submetido. Contudo, considero a ‘Veja’ uma revista
muito mais que tendenciosa, considero-a torpe. Trata-se de uma
publicação que estimula o reacionarismo ressentido, paranoico e feroz
que temos visto se alastrar pela sociedade; uma revista que aplaude o
estado de exceção permanente, cada vez mais escancarado em nossa
“democracia”; uma revista que mente, distorce, inverte, omite, acusa,
julga, condena e pune quem não compartilha de suas infâmias – e faz tudo
isso descaradamente; por fim, uma revista que desestimula o próprio
pensamento ao ignorar a argumentação, baseando suas suposições
delirantes em meras ofensas.
Sendo assim, qualquer forma de participação nessa publicação
significa a eliminação do debate (nesse caso, nem se poderia falar em
empobrecimento do debate, pois na ‘Veja’ a linguagem nasce morta) – e
isso ainda que a revista respeitasse a integridade das palavras de seus
entrevistados e opositores, coisa que não faz, exceto quando tais
palavras já tem a forma do vírus.
Dito isso, minha resposta é: Preferiria não.”
Clap, clap, clap. De pé.
Tal sentimento está amplamente espalhado pela sociedade. Descontados
fanáticos conservadores, ou simplesmente analfabetos políticos cujos
heróis são Diogo Mainardi ou Reinaldo Azevedo, a Veja é objeto de uma
mistura de desprezo e ódio.
O mérito da resposta de Sílvia é expressar um sentimento comum a tantos e tantos brasileiros.
Em meus tempos de Abril, fazíamos às vezes um exercício. Se determinada revista fosse uma pessoa, qual seria?
A Veja, hoje, por esse sistema, seria uma mistura de Olavo de Carvalho e Marco Feliciano.
Olavo de Carvalho ocupou, por seus discípulos, a revista. E Marco
Feliciano é alma gêmea de OC: conforme demos na seção Essencial, o
pastor fez na Câmara dos Deputados, esta semana, uma defesa apaixonada
do astrólogo que hoje é um ídolo dos reacionários do Brasil.
A Veja teria já problemas extraordinários de sobrevivência caso
fizesse bom jornalismo. Revista, na era digital, é um objeto de
obsolescência espectral.
São cada vez menos os leitores e os anunciantes.
Fazendo o que faz, uma panfletagem abjeta, a Veja apenas apressará
sua marcha rumo ao cemitério. E deixará não memórias agradáveis, mas a
sensação de alívio por o horror que ela representa ter enfim acabado.
Quem chorará a morte de uma revista que, para usar as palavras de
Sílvia Viana, “mente, distorce, inverte, omite, acusa, julga, condena e
pune quem não compartilha de suas infâmias”?
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