“Sinto falta de ter uma vida normal”: Miruna, filha de José Genoino, fala ao DCM
José Genoino foi condenado no STF pelos crimes de formação de
quadrilha e corrupção ativa em 2012. A pena é de seis anos e 11 meses no
regime semiaberto, além de multa de 468 mil reais.
Genoino só reconquistou seu direito de poder trabalhar, permitido em
regime semiaberto, no dia 25 de junho de 2014, sete meses depois da
prisão. Ele sofre de problemas cardíacos e chegou a ser transferido para
a prisão domiciliar antes de ser enviado novamente para a Papuda, em
Brasília.
Para falar de sua atual situação, a da família, o papel da mídia e do
STF, o DCM conversou com Miruna, filha de Genoino. Aos 33 anos, ela é
pedagoga e professora do 1º ano do ensino fundamental.
Do que você sente mais falta depois de todo este processo?
Sinto falta de ter uma vida normal. De poder fazer planos, poder
planejar coisas boas, poder contar com meu pai sempre. Sinto falta da
liberdade de uma vida simples.
Quando eu nasci, minha mãe teve uma depressão pós-parto originada de
seus traumas como presa política na ditadura militar. Ela não pôde
cuidar de mim. Quem cuidou e quem foi a mãe e pai ao mesmo tempo foi meu
pai José Genoino. Desde então, a nossa ligação é maior do que tudo e
ultrapassa todas as fronteiras do concreto. Nosso amor é maior do que o
mundo. Farei o que for preciso, sempre, para defender meu pai.
Você acredita que Joaquim Barbosa promoveu uma perseguição sistemática durante o julgamento?
Não quero falar sobre esta pessoa. Falar dele só me traz desgosto.
Outros ministros, como Marco Aurélio Mello, Ayres Britto e
Celso de Mello não contribuíram ainda mais para a condenação do seu
pai?
Todos os que votaram pela condenação do meu pai sabiam que ele era
inocente. Eles são responsáveis pela situação de José Genoino.
Em 12 anos de governo do PT, qual o patrimônio de seu pai?
Meu pai mora no mesmo sobrado no bairro do Butantã que nunca aparece
na grande mídia, porque não condiz com a imagem que quiseram criar dele.
Como a sua família lida com acusações de que seu pai enriqueceu ilicitamente com o mensalão?
Agora estamos num momento em que esse choque da acusação absurda e
injusta não ocupa mais nossas mentes. Estamos focados em lutar para que
meu pai saia assim que possível da cadeia, para que ele se recupere e
tenha os cuidados de que necessita. Não existe dúvida entre os que nos
conhecem, e mesmo daqueles que nos acusaram, de que não somos ricos.
Meus pais moram na mesma casa ainda. Meu pai atualmente nem carro tem
mais, enquanto eu e meus irmãos trabalhamos para nos sustentar. Somos
uma família normal.
Como você tem lidado com a pressão?
Hoje em dia não temos mais a mídia nos pressionando, porque tudo de
ruim que puderam fazer conosco, eles conseguiram. Tudo. Nos humilharam e
nos destruíram de todas as formas possíveis. Houve desrespeito e o pior
de tudo foi quando regozijaram com a nossa desgraça. Não respeitaram
nem meus filhos, de 6 e 5 anos na época da prisão. Hoje eles tem 7 e 6
anos. Quando eles nos pressionavam não existia nada que pudéssemos
fazer, nada mesmo.
As famílias dos outros condenados ajudaram vocês neste momento difícil? O PT e Dilma ajudaram vocês?
Prefiro não responder de forma particular, falando de cada um dos
apoios. Cada um ajudou de forma diferente, dentro de suas
possibilidades. Apenas comento que sim, nós nos sentimos amparados por
diferentes pessoas para suportar essa situação.
Como estão sendo as visitas? Como está sendo passar o dia com ele?
As visitas acontecem apenas às quartas-feiras. São momentos
agridoces. É um alívio vê-lo, abraçá-lo e conversar, mas é triste demais
ver onde ele está. É revoltante…
Por que você acredita que, nos últimos 10 anos, a mídia
associa o PT à corrupção, como se não houvesse outros partidos corruptos
ou com acusações semelhantes?
Porque a mídia criou um circo como o do mensalão. Ela vai tentar se
aproveitar desta farsa para ter todos os benefícios possíveis e
imagináveis. E usar o processo para marcar o PT é a maior das
estratégias.
Como você avalia a reação do seu pai?
Eu vejo meu pai com uma postura muito firme durante todo o processo,
especialmente quando acabou o julgamento e ele foi condenado. Ali ele
nos preparou para a firmeza, para mantermos a cabeça erguida, sempre. Na
prisão em novembro, a reação foi um pouco diferente porque ele vinha da
convalescência da cirurgia. Ele assimilou o fato de que quase tinha
morrido, por isso estava mais sensível a toda a situação. Meu pai sempre
quis ser forte e firme, mas tinha a questão do seu corpo, de suas
limitações depois do que tinha acontecido. Mesmo assim, ele foi nos
ajudando o tempo todo, para que soubéssemos enfrentar a situação da
melhor forma possível. Não presenciei o momento em ele foi preso na
época da ditadura, mas ouvi minha mãe dizer que foi pior agora, porque
foi preso injustamente dessa vez em uma democracia.
Ao erguer o punho esquerdo, Genoino fez uma espécie de resistência pacífica?
Claro que sim. E isso foi comunicado para a nossa família. A mensagem era: não vou baixar a cabeça. Não vou.
Como está o estado de saúde do seu pai hoje?
Estável dentro da instabilidade emocional. Ele não consegue
equilibrar o seu índice de coagulação sanguínea e isso nos preocupa
muito.
Quando seu pai terminar de cumprir a pena, ele voltará à vida pública?
Ele é quem terá de dizer. Mas o que sabemos até agora é que não.
Você tem algum interesse pela vida pública ou política?
Não. Quem viu uma pessoa amada dedicar a vida à política, ao combate
da injustiça, à igualdade, acabar dentro de uma prisão, doente e
sozinho, jamais sentiria vontade de entrar para a política.
Você acredita que a história absolverá seu pai daqui a alguns anos, mesmo com essa condenação do STF?
Tenho certeza disso. Não sei se ele vai ver isso acontecer. Talvez eu
também não, mas tenho fé que meus filhos vejam a história ser
recontada. Eles dois poderão ser recompensados pelo que sofrem agora.
Minha grande dor é de filha, ao ver meu pai assim. E é de mãe também,
por ter visto meus filhos lidando com a maldade e a injustiça tão cedo.
Postado em 09 jul 2014
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