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sexta-feira

Dores, gritos e denúncias de uma mulher torturada num pau de arara




Querida Professora Salma


És uma de minhas melhores alunas da disciplina “História da Educação”, que tenho a honra de trabalhar em sala de aula. 


A avaliação de valoração a teu respeito prende-se a alguns fatores: 1. à tua emocionante sinceridade. Não usaste de máscara e honestamente declaraste que te defrontaste com outra visão da história da educação e de maneira diversa do que o “conhecimento” da história do Brasil que recebeste na formatação feita pela ditadura e pelo neoliberalismo. Lembro-me de tuas frases: “professor, o senhor me colocou em crise. Tudo o que aprendi foi errado. Minha cabeça dói.” No Facebook exclamaste: “por que não aprendi assim antes?” Tua honestidade é maravilhosa e diversa de muit@s professor@s que se têm como donos do saber e do conhecimento, navegando sobre as águas turvas da arrogância. 2. Por seres pentecostal assembleiana surpreendes-me. De modo geral o cristianismo construído pela maioria das igrejas exerce o papel diabólico de alienar suas membresias e jogá-las nos braços da direita e no vazio social e anticidadania. Considero isso, aliás, clamorosa traição às raízes cristãs palestinas. Tu não. Vibraste de alegria intensa com a descoberta da verdade a ser construída na leitura, no estudo, nas pesquisas, nos debates e no esforço intelectual. Teu rosto vibrava como num êxtase de prazer ao vivenciares outro olhar para a história feita por falsos “vencedores”,  que o são por produzirem filas de derrotados pela injustiça e pela exclusão de seus direitos. Tanto foi a tua alegria e de tua vizinhança de sala de aula que nosso amigo e teu colega poeta escreveu uma poesia e nela se referiu ao orgasmo que viviam em nossas aulas de “História da Educação no Brasil”.


Pois bem, minha amiga e irmã, nosso País experimenta nessa última semana de março e nas próximas profundo debate sobre a ditadura civil-militar que golpeou nossa Pátria há 50 anos.


Nesse debate os porões da ditadura emergem carregados de gritos d@s torturad@s, do sangue esborrifado nas caras dos torturadores e dos cadáveres de noss@s irm@s triturad@s, insepultos em nossas consciências, graças à máquina assassina da ditadura,  porque noss@s heróis/heroínas não se acovardaram nem se omitiram, mas lutaram contra o terror que se abateu sobre nós. 


Uma dessas historias sofridas é a da historiadora e educadora Dulce Pandolfi. 


Dulce compartilha uma frase ouvida numa seção covarde de torturas, que revela muito bem, diria excelentemente bem, a intenção da ditadura: “Aqui não existe Deus, nem Pátria, nem Família. Só existimos nós e você”.


Exatamente isso: não existe Deus. “A marcha da família com Deus pela liberdade” sempre mentiu. Os torturadores falaram a verdade contra as falsidades dos padres, bispos e pastores que ajudaram a golpear o Brasil. No banditismo praticado pela ditadura não existe Deus.


Os golpistas eram “profissionais” e serventes do golpe que ajudou os Estados Unidos a humilhar o Brasil e a ajoelhar seu povo à ganância de sua exploração e falta de respeito conosco e com a soberania de nosso País. Para esses “funcionários” torturadores, como as polícias bandidas de hoje, não existe Pátria. O que existe para eles é um quintal de fundos para fazer negócios escusos e roubar povo o brasileiro, como o fez também a política neoliberal de Fernando Henrique Cardoso. 


Para eles também não existe família, como mentiu a “marcha da família...”. Torturar e matar pais, mães e filh@s não interessou se isso implicaria e destruição de famílias. Não importa se são famílias, se são fundamentais ao amor e à formação das futuras gerações. Nunca pensaram nas crianças e n@s filh@s órfãos da ditadura. Nunca se sensibilizaram com o sofrimento insuportável d@s torturad@s nem dos órfãos dos assassinatos. Aliás, é bom que se diga que é essa a postura capitalista, pai do nazismo e do fascismo, que não se comove em desempregar, de marginalizar e destruir vidas através das exclusões que promove. 


Afirmaram, na, talvez, maior das violências, que “existimos nós e você”. Seccionaram as almas sociais de suas vítimas, arrancaram-nas da essência social representada por suas famílias, por suas comunidades, por seus partidos, por suas instituições de ensino, por seus partidos etc. Os torturadores, representantes assassinos e bandidos da ditadura que pisou na liberdade, na democracia e na justiça social, diabolicamente colocaram-se sobre tudo e sobre tod@s. O verbo existir usado por eles é muito forte, mas simboliza o que pensaram de si e do Brasil. Eram absolutamente egoístas e estúpidos na aventura a que nos submeteram. “Pensavam” que tudo era deles, somente deles. 


Para abrangeres mais a compreensão do que escrevi sugiro que acesses e leias aqui o testemunho corajoso e eloquente de nossa heroína Dulce Pandolfi e também de Lucia Murat. 


Abraços críticos e fraternos na luta pela justiça e pela paz.

Dom Orvandil: bispo cabano, farrapo e republicano, em todas as situações.


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