Efeitos tardios da guerra: muitas crianças vietnamitas sofrem pelo uso
do “Agent Orange”, mesmo décadas depois. – FOTO: ROLANDSCHMID/BLOOMBERG
Querida Maria Eugênia
Obrigado por teu lindo e-mail tecendo considerações sobre meu
artigo referente aos “coxinhas” e à médica de Goiânia, também coxinha, que boicota
a saúde pública. Minha querida amiga professora Yolanda Azambuja, que
reencontrei pelo Fecebook, também me escreveu indignada com a médica coxinha. Quem
parece não se importar com nada é o médico Fernando Machado, Secretário de
Saúde de Goiânia. Nada respondeu. Será que ele não se interessa com o modo como
o povo é tratado pelos profissionais sob a responsabilidade dele? Será que ele
é mais cooperativista do que realmente um democrata a serviço do povo? Será que
ele não se informa sobre a avaliação dos serviços dos profissionais de sua
secretaria? Por que Fernando Machado nada disse?
Em todo o caso, minha querida amiga e ex-aluna Maria Eugênia,
tua reação ao meu artigo me emociona. És estudante de medicina e não és
coxinha. Apesar se seres muito jovem, és detentora de uma consciência
profundamente sensível à realidade. Tudo indica que as raízes de classe de tua performance
consciencial não te abandonarão.
Dizes-me com orgulho que fazes medicina graças ao PROUNI porque te originas de
uma família pobre de catadores de papel. Se não fora esse programa social do
governo federal não chegarias à universidade como sempre sonhara, muito menos
para fazer medicina, testemunhas-me com emoção. Pelo que me contas teu projeto
de vida é o de te dedicares aos mais pobres dos pobres dos recantos onde não
querem trabalhar os médicos playboys coxinhas, as zonas ribeirinhas da Amazônia.
Dizes-me que a Direção Executiva Nacional dos Estudantes de
Medicina tem razão ao afirmar que os argumentos das entidades médicas sobre
falta de plano de carreira de Estado, de estruturas de hospitais, de unidades
de saúde e dos problemas de vínculos de trabalho com as prefeituras das entidades
médicas são fracos. Claro, tudo precisa embora melhorar muito. Na verdade, como
diz a Denem, o que dizem os médicos através de suas entidades está mais para
superficial, porque não conhecem a realidade da saúde de nosso País, e
cooperativista do que para os reais interesses do povo, principalmente dos mais
distanciados dos recursos da saúde. Mencionas que o Denem, que realizou recente
congresso em Belém no final de julho, avalia que a formação e a atuação médica
não leva em consideração a “chamada determinação social do processo
saúde-doença” (clique aqui para ler). Pelo
contrário, retira os médicos do lado dos pacientes enquanto entes sociais,
trabalhadores e carentes de justiça política e econômica. O modelo que vertebra
a formação médica é o do médico-hospitalar, aquele da decoreba de protocolos e
de remédios, de acordo com o gigantesco interesse das indústrias farmacêuticas,
das farmácias e dos laboratórios.
O que me inquieta, Maria Eugênia, é o envelhecimento mental dos
estudantes e médicos, apesar de ainda muito jovens cronologicamente. Espanto-me
com inúmeros coxinhas da área da saúde, acostumados com vida playboy no uso de automóveis
de luxo, de festas de fins de semana, que descobriram as ruas, sob o comando da
Globo, da direita e do seu pior, os fascistas, que gritam por aí contra o Mais
Médicos do governo federal, mas que nada fazem para construir um projeto de
saúde realmente social. São tão mesquinhos que não disfarçam a velha guerra
pelo nojento mercado, cujo único interesse é o econômico, são os lucros
financeiros, os investimentos e não o lucro social, o bem do povo.
Esse é o mal dos coxinhas de todas as frentes. Fazem
cartazes, gritam, ofendem, opõem-se a todos e alegam que os partidos, os
sindicatos, as entidades estudantis nem ninguém os representa. Portam-se como
iluminados em cujos cérebros repentinamente os deuses despejam conhecimento e
sabedoria que não quiseram dar a toda à sociedade nem aos que deram suas vidas
nas lutas por uma sociedade justa. Enquanto tu e a tua organização se reuniam
em assembleia em Belém em julho, debruçados na análise científica da saúde, da
formação mais justa dos futuros profissionais, das críticas e pressões corretas
a serem feitas, os coxinhas gritavam coisas fantasiosas sobre a realidade.
Nisso arrebatam outros ingênuos e bobos que os emitam, mas sem o menor
argumento sério sobre nada. Muitas vezes os convidamos à luta, contas-me, e
sempre deram desculpas para não participar. Sempre se alienaram. Partidos
políticos sérios, odiados pela direita, convidam cidadãos para se filiar, para
participar e eles mentem, alegam que não têm tempo, alienam-se. Mas agora,
chamados pela Globo e pelos golpistas a se opor aos partidos e aos líderes
populares, saíram para as ruas para dizer que ninguém os representa. Tu, com
apenas 23 anos, te revoltas com os coxinhas e eu, também.
Na verdade, minha querida amiga Maria Eugênia, queria te
convidar a ler uma matéria que, a meu ver, identifica a verdadeira base da
saúde e é ali que somos assassinados todos os dias. Trata-se do odioso mercado
dos alimentos. Aí inscreve-se o mais agressivo e destruidor dos grupos atuais,
que somente busca lucro, mesmo que envenene e desgrace milhões de vidas ao
redor do mundo. Trata-se do mais sujo de todos que é o Monsanto, empresa
americana que se associa a mais apodrecida tecnologia de espionagem para
boicotar as produções saudáveis de alimentos e incentivar as indústrias de alimentação
venenosas a negociar com ele. Esse grupo não titubeia em matar através de
alianças militares e de derrubadas de governos democráticos, coisas que os
coxinhas nem imaginam.
Conhecendo tua consciência e inteligência, que coloca-se em
nível infinitamente superior aos plumas ventou levou, os coxinhas de todas as
idades e formações, lerás e recomendarás que todas as pessoas leiam a matéria
abaixo. É longa, mas para quem não é coxinha que só lê Veja, assiste a Globo e
que acredita em papai Noel vale a pena ler. É de arrepiar e encher a gente de
raiva, minha amiga. Somos envenenados todos os dias... E com venenos pesados
que geram milhões de dólares aos poderosos!
Abraços críticos e fraternos na luta pela justiça e pela paz.
Dom Orvandil: bispo cabano, farrapo e republicano.
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O lado mais sujo da Monsanto
– on 11/08/2013Para impor seus produtos em todo o mundo, empresa mobiliza agências de espionagem norte-americanas, vigia cientistas e dispara ataques cibernéticos
Por Marianne Falck, Hans Leyendecker e Silvia Liebrich, no Süddeutsche Zeitung | Tradução: Regina Richau Frazão | Imagem: Eric Drooker
O grupo americano Monsanto (1) é um gigante no agronegócio – e é o
número um na área da controvertida tecnologia genética “verde”. Para
seus opositores, a Monsanto é um inimigo assustador. E continuam
acontecendo coisas intrigantes que fazem o inimigo parecer ainda mais
aterrorizante.
No mês passado, a organização europeia protetora do meio ambiente
“Amigos da Terra” e a Federação para meio Ambiente e Proteção à Natureza
Deutschland (BUND) quiseram apresentar um estudo sobre os efeitos do
herbicida glifosato no corpo humano. Os herbicidas que contêm glifosato
são carros-chefes da Monsanto. A empresa fatura mais de dois bilhões de
dólares somente com o agente Roundup. Os “herbicidas Roundup”, assim
sustenta a Monsanto, “têm uma longa história de uso seguro em mais de
100 países”.
Quando os vírus atacaram seus computadores, os ativistas se indagaram: será que estamos vendo fantasmas?
Entretanto existem também pesquisas alegando que o agente
possivelmente cause prejuízos a plantas e animais; e o estudo mais
recente demonstra que muitos moradores de grandes cidades vivem com o
veneno no próprio corpo, sem terem conhecimento disso. Como tantas outra
coisas relacionadas a esse assunto, é discutível o que exatamente o
pesticida é capaz de provocar no organismo humano.
Dois dias antes da publicação do estudo em dezoito países, um vírus
paralisou o computador do principal organizador, Adrian Bepp. Houve
ameaça de cancelamento das entrevistas coletivas em Viena, Bruxelas e
Berlin. “Surgiu pânico”, lembra Heike Moldenhauer da BUND. Os ativistas
do meio ambiente viram-se correndo contra o tempo.
Moldenhauer e seus colegas tinham feito diversas especulações sobre
os motivos e a identidade do misterioso agressor. A especialista em
tecnologia genética do BUND acredita que o principal objetivo do
desconhecido fornecedor do vírus tenha sido “gerar confusão”. Não há
nada pior para uma pesquisa do que cancelar uma coletiva da imprensa. “E
nós ficamos nos perguntando se estávamos vendo fantasmas”, diz
Moldenhauer.
Não há nenhum indício de que Monsanto tenha sido o fantasma, ou que
tenha algo a ver com o vírus. O grupo sustenta que não faria algo assim.
Preza “agir com responsabilidade”: “hoje em dia é muito fácil fazer uma
afirmação e de difundi-la”, diz a Monsanto. Dessa forma, prossegue
“periodicamente são feitas afirmações duvidosas e populistas que
denigrem nosso trabalho e nossos produtos, carecendo de qualquer
abordagem científica.”
Os críticos do grupo têm outra visão. Ela tem a ver com a espessa
trama tecida ao redor do mundo pela Monsanto, cujos entroncamentos estão
localizados nos serviços secretos norte-americanos, nas suas forças
armadas, em empresas de segurança privadas e, é claro, também junto ao
governo dos EUA.
Um número expressivo de críticos da Monsanto relata ataques
cibernéticos regulares, praticados com gabarito profissional. Também os
serviços secretos e o serviço militar gostam de contratar hackers e
programadores. Estes são especialistas em desenvolver cavalos de tróia e
vírus para penetrar em redes de computadores alheios. O ex-agente da
CIA Edward Snowden chamou atenção ao nexo entre as ações dos serviços de
notícias e as movimentações da economia. No entanto, esta ligação
perdeu força diante das demais denúncias.
Alguns dos poderosos defensores da Monsanto entendem bastante do
assunto da guerra cibernética. “Imagine a internet como uma arma que
está sobre a mesa. Ou você a pega, ou seu concorrente irá fazê-lo, mas
alguém será morto”, foi o que disse Jay Byrne em 2001, quando era chefe
de relações públicas na Monsanto.
É comum empresas lutarem com métodos escusos em função daquilo que
consideram como seu direito, como sendo o certo. Porém, os termos “amigo
ou inimigo”, “ele ou eu” já denotam linguagem de guerra. E numa guerra é
preciso ter aliados – por exemplo, aqueles instalados no serviço
secreto.
São conhecidos os contatos da Monsanto com o notório ex-agente secreto Joseph Cofer Black,
que colaborou na formulação da “lei da selva”, na “campanha
anti-terror” de George W. Bush. Ele é especialista para trabalho sujo,
da linha dura. Trabalhou para a CIA durante quase trinta anos, sendo
inclusive o chefe “antiterrorista”. Mais tarde seria o vice-presidente
da empresa de segurança particular Blackwater, que mandou milhares de
mercenários para o Iraque e o Afeganistão.
Pesquisas mostram como são estreitos os laços da direção da empresa
com o governo central em Washington e com representações diplomáticas
dos EUA no mundo inteiro. A Monsanto tem auxiliares eficazes em diversos
lugares. Antigos colabores da corporação ocupam altos postos nos EUA,
em departamentos governamentais e ministérios, em federações da
indústria e universidades. Por vezes, são relações quase simbióticas. De
acordo com informações da organização anti-lobby Open Secrets, no ano passado 16 lobistas da Monsanto ocuparam cargos de alto nível no governo norte-americano e em agências reguladoras.
Para a empresa, trata-se de ocupar novos mercados e em vender
alimentos a uma população mundial que cresce em ritmo alucinante. A
engenharia genética e as patentes relacionadas com plantas desempenham
um papel importante nesse contexto. Nos Estados Unidos, o milho e soja
geneticamente modificados representam 90% dos cultivos — e este
percentual cresce de modo constante também no resto do mundo.
Apenas no mercado europeu, nada acontece. Diversos países da União
Europeia (UE) têm muitas restrições com relação ao futuro da Monsanto, o
que visivelmente desagrada ao governo dos EUA. No ano de 2009, Ilse
Aigner, Ministra da Alimentação, Agricultura e Proteção ao Consumidor da
Alemanha, filiada ao Partido da União Social-Cristã, havia banido o
tipo de milho MON810 também dos campos alemães. Ao viajar logo depois
para os Estados Unidos, foi interpelada pelo colega americano Tom
Vilsack, com respeito à Monsanto. O político, do Partido Democrata,
havia sido governador no estado federal Iowa, de característica rural, e
logo tornou-se adepto dos transgênicos. Em 2001, foi eleito pela
bioindústria como “governador do ano”.
Infelizmente, não há registro da conversa entre Vilsack e Aigner.
Dizem que foi controvertida. Um representante do governo federal alemão
descreve o tom do diálogo da seguinte forma: houve “esforços maciços de
forçar uma mudança de rumo dos alemães com respeito à política genética”
. A fonte da informação não quis se pronunciar sobre o tipo dos
“esforços maciços”, nem sobre a tentativa de “forçar” alguma coisa. Isto
não se faz entre amigos ou parceiros.
Graças a Snowden e ao Wiki-Leaks, o mundo pode imaginar o que
acontece entre amigos e parceiros, quando o poder e o dinheiro estão em
jogo. Dois anos atrás, o Wikileaks publicou despachos diplomáticos, que
incluíam detalhes sobre a Monsanto e a engenharia genética.
Em 2007, por exemplo, o então embaixador norte-americano em Paris,
Craig Stapleton, sugeriu ao governo dos EUA que elaborasse uma lista
suja dos países da União Europeia que estivessem dispostos a proibir o
plantio de sementes geneticamente modificadas por empresas
norte-americanas. O teor da mensagem secreta: “A equipe parisiense
sugere propor uma lista de medidas de retaliação que irá causar dores à
Europa”. “Dores”, “retaliação” – a rigor, essa não é exatamente a
linguagem da diplomacia.
A luta pela autorização do famoso milho geneticamente manipulado
MON810 na Europa foi conduzida pela Monsanto com muito trabalho de lobby –
e ao final, a empresa perdeu por completo. O produto foi banido
inclusive dos mercados prestigiados da França e da Alemanha. Uma aliança
entre políticos, agricultores e pessoas relacionadas às igrejas recusou
a engenharia genética nas plantações, e os consumidores não a querem em
seus pratos. No entanto, a batalha ainda não terminou. Nas negociações
iniciadas nos mês passado entre os EUA e a UE, sobre um tratado de
“livre” comércio, os Estados Unidos esperam, entre outras coisas, uma
abertura dos mercados para a tecnologia genética.
Com o Tratado de Livre Comércio, EUA querem
abrir o mercado de transgênicos na Europa
abrir o mercado de transgênicos na Europa
Fazer lobby por
uma empresa nacional no exterior é algo visto como dever cívico, nos
EUA. Há muito, as mais significativas entre os dezesseis agências de
inteligência norte-americanas entendem seu trabalho como apoio aos
interesses econômicos norte-americanos no cenário mundial. Alegando
combater o terrorismo, não somente espionam governos, órgãos públicos e
cidadãos, mas também empenham-se — do seu modo muito peculiar — a favor
de interesses econômicos do país.
Alguns exemplos:
Várias décadas atrás, quando o Japão ainda não era uma potência
econômica, surgiu nos Estados Unidos a pesquisa “Japão 2000”, elaborada
por um colaborador do Rochester Institute of Technology (RIT) Através de
uma “política comercial temerária”, assim dizia o estudo, o Japão
estaria planejando uma espécie de conquista do mundo, e os perdedores
seriam os EUA. A segurança nacional dos Estados Unidos estaria ameaçada e
a CIA deu o grito de guerra.
Na competição global, a economia norte-americana tinha que ser
protegida dos “dirty tricks”, os truques sujos dos europeus, declarou o
ex diretor da CIA James Woolsey. Por esta razão, os “amigos do
continente europeu” estariam sendo espionados: os Estados Unidos são
limpos…
Edward Snowden esteve certa vez pela CIA na Suíça, e há dias
relatou a maneira como a empresa teria tentado envolver um banqueiro
suíço na espionagem de dados bancários. A União Europeia permitiu aos
serviços norte-americanos examinar em profundidade os negócios
financeiros de seus cidadãos. Segundo dizem, o objetivo é secar as
fontes financeiras do terror. Os meios e os fins, entretanto, são
altamente discutíveis.
Na Suíça que anteriormente foi palco de muitas histórias de agentes,
desenrolou-se um dos episódios que tornaram a Monsanto particularmente
misteriosa: em janeiro de 2008, o ex agente da CIA Cofer Black viajou
para Zurique para encontrar-se com Kevin Wilson, na época, o responsável
pela segurança para questões globais. A pergunta, a respeito do que os
dois homens estariam falando, ficou no ar. Certamente os assuntos eram
os de sempre: opositores, negócios, inimigos mortais…
O jornalista investigativo Jeremy Scahill, autor da obra sobre a empresa de mercenários Blackwater, escreveu em 2010, no jornal semanal americano The Nation,
sobre esse estranho encontro em Zurique. Tinha recebido documentos
vazados, a respeito do assunto. Deixavam claro que a Monsanto estava
querendo se defender contra ativistas que queriam destruir suas
plantações experimentais; contra críticos que se posicionavam contra a
empresa de modificação genética. Cofer Black era, para todos os efeitos,
a pessoa certa: “Vamos tirar as luvas de pelica”, havia declarado após
os ataques de 11 de setembro, conclamando seus agentes da CIA a
livrar-se de Osama bin Laden no Afeganistão: “Apanhem-no: quero a cabeça
dele dentro de uma caixa”. Mas ele também entende muito do outro
negócio do serviço secreto; aquele que opera com fontes de acesso
público.
Ao encontrar-se com Wilson, dirigente de segurança na Monsanto, Cofer
Black ainda era vice na Blackwater, cujos clientes eram, entre outros, o
Pentágono, o Departamento de Estado, a CIA, e logicamente, empresas
particulares. Mas em janeiro de 2008 houve muitos tumultos, pois 17
civis foram assassinados no Iraque por mercenários da empresa de
segurança, e alguns homens da Blackwater chamaram atenção de
funcionários do governo iraquiano devido a atos de suborno. Acontece que
Cofer Black, na época, era também o chefe da empresa de segurança Total
Intelligence Solutions (TIS), uma subsidiára da Blackwater, e que,
apesar de sua reputação menos devastadora, contava também com “experts”
excelentes e versáteis…
De acordo com as próprias informações, a Monsanto fez negócio, na
época, com a TIS e não com a Blackwater. Era inquestionável que a
Monsanto fora abastecida pela TIS, com relatórios sobre as atividades
dos críticos – as quais poderiam representar um risco para a empresa,
seus colaboradores ou seus negócios operacionais. Fazia parte tanto
coletar informações sobre ataques terroristas na Ásia quanto escanear
páginas da internet e blogs. A Monsanto frisava que a TIS, obviamente,
só tinha usado material de acesso público…
Isso corresponderia aos métodos de Cofer Black. Então – nada de ações escusas.
Costumava haver boatos frequentes de que a Monsanto quisera assumir o
controle da TIS, objetivando a sua segurança geral. E hoje surgem novos
rumores, segundo os quais o grupo estaria avaliando a possibilidade de
assumir a empresa Academi, que formou-se após reorganizações da antiga
Blackwater. Será que os rumores procedem? “Em geral, não discutimos os
detalhes do nosso relacionamento com os prestadores de serviço – a não
ser que essas informações já estejam disponíveis ao público”, foi a
única resposta da Monsanto.
Toda empresa possui a sua própria história, e da história da Monsanto
faz parte um assunto que queimou sua imagem não apenas junto aos
hippies: no passado, a Monsanto esteve na linha de frente dos produtores
do pesticida “Agente Laranja”, utilizado até janeiro de 1971 na guerra
do Vietnã pelos militares norte-americanos. Os constantes bombardeios
químicos desfolhavam as florestas para tornar o inimigo visível. Os
campos eram envenenados para que o vietcong não tivesse mais
nada para comer. Nas áreas pulverizadas multiplicou-se por dez o número
de nascimentos de crianças com anomalias; nasciam sem nariz, sem olhos,
com hidrocefalia ou fendas no rosto – e as forças armadas dos EUA
asseguravam que o produto da Monsanto seria tão inofensivo quanto a
Aspirina.
Será que na guerra, tudo é permitido?
Principalmente na moderna guerra cibernética?
Principalmente na moderna guerra cibernética?
Chama atenção o fato de que alguém esteja dificultando, hoje, a vida
dos críticos da Monsanto, ou que alguma mão invisível esteja
interrompendo carreiras. Mas, quem é esse alguém? São alvos de ataque
cientistas como a australiana Judy Carman,
que, entre outros, tornou-se conhecida com pesquisas de produtos
transgênicos. Suas publicações são questionadas por professores, os
mesmos que tentam minimizar a importância dos estudos de outros críticos
da Monsanto.
Mas o assunto não se resume a escaramuças nos círculos científicos.
Pois diversas páginas da internet onde Carman publica suas pesquisas,
tornam-se alvo de ataques cibernéticos e, segundo impressão de
pesquisadora, são sistematicamente observadas. Exames do IP de seu site
demonstram que não apenas a Monsanto acessa regularmente essas páginas,
mas também diversos órgãos do governo norte-americano ligados às forças
armadas. Entre outros, o Navy Network Information Center, a Federal
Aviation Administration e o United States Army Intelligence Center, um
órgão do exército para o treinamento de soldados em tarefas de
espionagem. O interesse da Monsanto nessas pesquisas pode ser observado,
também no caso de Carman. “Mas não entendo, por que o governo americano
e o exército mandam me observar“, diz ela.
Coisas estranhas aconteceram também com a GM Watch, uma organização
crítica da engenharia genética. A colaboradora Claire Robinson fala de
ataques cibernéticos constantes à página desde 2007. “Toda vez em que
aumentamos a segurança do site, nossos oponentes tornam-se mais tenazes e
seguem novos ataques, ainda piores”, explica. Também neste caso não se
acredita em coincidência. Em 2012, quando o cientista francês Eric
Séralini publicou uma pesquisa bombástica sobre os riscos à saúde
representados pelo milho transgênico e o glifosato, o site da GM Watch
foi atacado e bloqueado. Isso se repetiu quando foi publicado o
posicionamento do órgão europeu de inspeção alimentar, a EFSA. Em ambos
os casos, o momento foi habilmente escolhido: no exato instante em que
os editores tentavam publicar os textos. Não foi possível determinar
quem estava por trás dos ataques.
A própria Monsanto, como já foi dito, faz questão de frisar que opera “com responsabilidade“.No entanto, é fato que a empresa tem muitos interesses em jogo.
Trata-se de projetos legislativos, e em especial, das negociações em
curso, relacionadas ao Tratado de “livre” comércio entre EUA e UE. Os
capítulos sobre Agricultura e Indústria Alimentícia são particularmente
delicados. Os norte-americanos têm como meta a abertura dos mercados
europeus para os produtos até então proibidos. Ao lado das plantas
transgênicas, estão incluídos aditivos controversos e a carne bovina
tratada com hormônios. As negociações certamente ainda vão se arrastar
por alguns anos.
O assunto é polêmico e as negociações serão duras. Por isso, o
presidente Barack Obama apontou Islam Siddiqui como chefe das
negociações agrícolas. Como especialista, trabalhou durante muitos anos
para o ministério de Agricultura americano. Mas, o que poucos sabem na
Europa: de 2001 a 2008 ele representou, como lobista registrado, a
CropLife America, uma associação industrial que representa os interesses
de produtores de pesticidas e produtos transgênicos. Entre eles, é
claro, a Monsanto. “A rigor, a UE não poderia aceitar tal interlocutor,
devido a seus interesses, opina Manfred Häusling que representa o
Partido Verde no parlamento europeu.
Englentich, a rigor. No médio-alto alemão, esta palavra (eigentlich)
sinificava “servil”, o que não seria uma má descrição do cenário atual —
onde os políticos europeus, e em especial os alemães, revelam uma
atitude de surpreendente aceitação, diante do fato de serem espionados
com regularidade por órgãos norte-americanos.
–1. A Monsanto é o a maior empresa agrária do mundo, e também a que
lidera a engenharia genética. Em 2012, o grupo ampliou seu faturamento
em 14%, em comparação ao ano anterior, chegando a 13,5 bilhões de
dólares. O lucro subiu 25%, atingindo dois bilhões de dólares. No mundo
todo, a empresa emprega 21.500 trabalhadores e tem filiais em mais de
50 países. Sua fundação data de 1901, pelo norte-americano John Queeny
em St. Louis, no estado de Missouri. O nome foi uma homenagem à família
de sua esposa. Primeiro, Queeny produziu o adoçante sacarina. Em pouco
tempo, o fabricante de bebidas Coca-Cola passa a fazer parte de seus
clientes. Logo depois da I Guerra Mundial, a Monsanto entrou no ramo dos
produtos químicos. Sua ascensão foi rápida. Em 1927, ingressou na bolsa
de valores, e ampliou sua atuação no setor químico, incluindo adubos e
fibras sintéticas. Investiu até mesmo na indústria petrolífera. Depois
da guerra do Vietnã, a Monsanto passou a focar mais intensamente o setor
agrário, o desenvolvimento de herbicidas e em seguida a produção de
sementes. Nos anos oitenta, a biotecnologia foi declarada seu alvo
estratégico. O próximo passo foi a modificação consequente para uma
empresa agrícola – e os outros segmentos foram deixados de lado.
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