Prezada amiga Jan Carvalho
Percebo em seu perfil no Facebook
que a amiga acompanha interessadamente a conjuntura social e política
brasileira. Certamente deparou-se com a história da jornalista Miriam Leitão,
que deixou de ser secreta, sobre sua prisão em tortura durante o regime
golpista que assaltou nosso País em 1964.
O fato de a jornalista
Miriam Leitão ser presa por agentes da ditadura militar causou surpresa pelo
contraste com seu pensamento e posição política atuais.
As pessoas de bem não
misturam as coisas. Aliás, analisar é a capacidade que possibilita a
inteligência a separar os fatos histórica, social, política, econômica,
cultural e ideologicamente. Assim, a jornalista Leitão merece solidariedade
pelos horrores que sofreu quando aos 19 anos, grávida, a fecharam numa sala
escura na companhia de uma cobra, com o propósito cruel de atormentá-la e
pressioná-la a dedurar pessoas e causa. Tem razão o Senador Eduardo Suplicy na
solidariedade que prestou à jornalista da Globo.
A revelação das perseguições
sofridas por Miriam desvenda que ela foi militante do PCdoB. Não tenho
condições de avaliar se com 19 anos uma pessoa tem tanta solidez teórica e
ideológica para garantir militância e postura de vida íntegras em quaisquer
situações e para toda a existência. O fato é que esse fato revelado não guarda
nenhuma relação com a atual jornalista Miriam Leitão.
Aliás, o fato de ser militante
comunista na juventude surpreende também por sua origem familiar, cultural e
religiosa. A jornalista global definia-se por ser reacionária de direita já
antes do nascimento. É filha do pastor presbiteriano Uriel de Almeida Leitão, do
seguimento eclesiástico mais extremado à direita do protestantismo brasileiro,
que apoiou e participou do golpe de 1º de abril de 1964. O teólogo e ex-pastor
Rubem Alves, pertencente a essa igreja, foi barbaramente perseguido e
massacrado pela cúpula diretiva dessa instituição evangélica. O teólogo Zwinglio
Dias, ex-pastor da Igreja Presbiteriana do Brasil, um dos criadores da EPU –
Igreja Presbiteriana Unida – sempre disse que a IPB tinha sua própria comissão
protestante de inquisição, muito mais cruel e desumana do que a romana
medieval. A família de Miriam Leitão se origina desse seguimento conservador. A
Comissão Nacional da Verdade acessou documentos que provam a participação de
pastores capelães militares nas violentas seções de torturas nos porões abjetos
da ditadura militar. Muitos desses pastores pregavam nos templos ricos e depois
desciam as escadas para torturar presos que lutavam contra a opressão e assalto
ao Brasil durante a sangrenta e golpista ditadura. Inclusive mataram muitos
presos. É daí que se origina Miriam Leitão.
Claro, muitos originários de
setores burgueses, conservadores e de direita, até fascistas, romperam com suas
fontes originárias e se entregaram à luta revolucionária. Quem sabe Miriam
Leitão assim se definiu e por isso pagou o custo da prisão e das torturas. Não
sei. Gostaria de saber.
O prezado jornalista Paulo
Nogueira, dono do site Diário do Centro do Mundo,
esforça-se para explicar o desvio de Miriam Leitão, indo da esquerda para a
direita. Em síntese, refere-se às dificuldades do jornalismo naqueles anos duros
da ditadura, principalmente em se tratando de mulher. Diz que as televisões não
eram bem vistas como espaços dignos para bons trabalhos jornalísticos. Miriam,
trabalhou no ninho de cobras revista Veja e foi estúpida e deselegantemente
demitida por um colega desleal e desumano, num final de semana, depois de
trabalho estafante e opressor. Daí em diante viveu peripécias até aportar no
jornal O Globo, da nefasta família Marinho. Afirmou-se na carreira, até chegar
à televisão onde até hoje faz análises econômicas de direita, favorecendo o
antissocial mercado.
Paulo Nogueira, no fundo,
advoga em favor da pressão das circunstâncias que atuam sobre os seres humanos
ao ponto de forçá-los a mudar rumos, indo da luta ao contra golpe. Tudo em
busca da sobrevivência. Miriam seria vítima desta força que torce pescoço e
consciências?
Será? Conheço pessoas
íntegras, cujos caminhos luminosos de luta por um mundo novo, as fizeram viver
vidas inteiras em dificuldades financeiras, mas que nunca traíram princípios,
causas nem companheiros. Noutras palavras, nunca se venderam.
Outrossim, conheço pessoas
que se venderam, que traíram a história e que mostraram durante o resto de suas
vidas que não eram confiáveis. Suas falas, escritos e atitudes revelaram
personalidades egoístas, autoritárias, desleais e de discursos defensores do
capitalismo, suas mazelas contra os pobres e defensivas do mercado e suas
perversidades.
Hoje numa reunião da Ibrapaz
eu pensava em Miriam Leitão e no que é ser de direita e de esquerda.
Pessoas de direita são
atualmente as que acham que tudo o que se faz no Brasil de 2002 para cá é
errado porque se dá muito valor aos pobres e muito da economia trouxe, segundo
elas, essa pobreza toda para os aeroportos, para viagens internacionais, para
as universidades, lugares antes reservados aos ricos.
Pessoas de esquerda acham bom
que se dá a inclusividade e discordam do que se faz porque lutam por justiça
social que vai além da inclusão, em direção à revolução. O que se faz, que é
muito em comparação ao neoliberalismo, é pouco, porque buscam uma sociedade
igualitária.
Pessoas de direita centram a
vida na consolidação econômica de sua família e dos seus interesses
empresariais.
Pessoas de esquerda lutam
pelo bem e pela justiça de todas as famílias brasileiras, inclusive a sua.
Pessoas de direita discursam
apaixonadamente em favor do mercado e de suas regras que definem profissões e
lucros.
Pessoas de esquerda
conversam o tempo inteiro em favor do Estado para gerir a sociedade de modo
justo, porque sabem que o mercado é injusto, falsário e excludente.
Pessoas de direita quando
falam usam a primeira pessoa do singular para dizer “eu quero”, “eu faço”, “eu
mando”, “eu ganho” etc.
Pessoas de esquerda falam a
partir do pronome pessoal “nós”, advogando conquistas coletivas de direitos
sociais.
Pessoas de direita têm como
ideologia o neoliberalismo, em favor de menos Estado e mais mercado. Menos
Estado que invista no povo e mais mercado que concentre privilégios em favor de
rendas e riquezas em poucas mãos.
Pessoas de esquerda
inspiram-se no socialismo que partilha rendas e riquezas, que reforça o Estado
que gira os interesses da maioria, os trabalhadores.
Pessoas de direita, demitem
e matam, se for preciso, para proteger seus negócios, interesses e lucros. Por
isso o mercado ama as guerras e as matanças, principalmente dos povos que lutam
por emancipação. Assim o mercado de armas lucra mais e acumula caixa para seus
donos: indústrias e bancos.
Pessoas de esquerda entregam
suas juventudes, suas energias e suas vidas em favor dos outros, em favor do
povo, na defesa do progresso social.
Pessoas de direita são
autoritárias e pensam que o coração humano situa-se anatomicamente no umbigo.
Por isso somente olham para baixo e para o centro de seus corpos e vidas.
Pessoas de esquerda sentem o
coração pulsar no peito e levantam os braços para estendê-lo aos outros e à
luta, por isso sua disposição para viver e para morrer pelas boas causas.
Pessoas de direita são
cruéis na fala quando apelam para apelidos que machucam, para adjetivos que
rebaixam, para vocábulos que maltratam, para atitudes traiçoeiras na condenação
dos mais humildes, pobres e trabalhadores.
Pessoas de esquerda amam
conversar para aprender e ensinar. Amam saber a história de cada pessoa, de
suas lutas e de suas alegrias. Pessoas de esquerda amam e reverenciam os
trabalhadores e se revoltam com a condição de exploração a que são submetidos
todos os dias.
Pessoas de direita não são leais
com pessoas e suas humanidades. Suas lealdades são centralmente com seus
negócios, lucros e saldos de sua empresas. Usam as pessoas.
Pessoas de esquerda são
leais às pessoas e à ideologia que liberta pessoas.
Pena que Miriam Leitão serve
a direita, ao mercado e ao terror neoliberal. Em nome deles sua
missão é mentir, manipular e proteger os negócios de seus patrões, mesmo
negando princípios que talvez animassem sua juventude e alguns deles aos seus
pais, mesmo conservadores a serviço de uma igreja que colaborou com o golpe e
orou pelos golpistas.
Abraços críticos e fraternos
na luta pela justiça e pela paz.
Dom Orvandil: bispo cabano,
farrapo e republicano, guiado pelo peito.
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