Querida professora Vera
Já te elogiei pessoalmente inúmeras vezes por
tua postura de humildade em face de tua história de lutadora de quem emergiu da
mais profunda pobreza. Ressaltas que saíste dentre os mais pobres e testemunhas
tua passagem por trabalhos através dos
quais foste humilhada por não te vestires em harmonia com os figurinos das
madames de tua igreja. Hoje és doutora com tese defendida na área do direito do
trabalho. Admiro-te por constantemente contares para nós, teus amigos, a
escalada sofrida que fizeste na superação e contornos de enormes obstáculos que
pessoas jogaram em teus caminhos, mas que superaste a todos. Também te admiro
por não te esqueceres do povo e dos injustiçados. Teus olhos marejam cada vez
que te deparas com as brutais injustiças que nossos irmãos brasileiros sofrem. Noutras
palavras, não esqueces tuas origens nem viras as costas ao povo.
Pois bem Vera, conheci um advogado em Caxias
do Sul que se originou dos pobres. Trabalhou numa metalúrgica. Depois de formado
em direito, passando o tempo, articulou-se com empresários ricos e virou o
olhar para os interesses da classe dominante, retrocedendo aos porões das
discriminações, dos preconceitos e, sobretudo, à postura abjeta do puxa
saquismo. Mora no centro da cidade em apartamento de médio padrão,
completamente esquecido dos pobres a quem chama de vagabundos ou de preguiçosos.
Sua postura na lida das defesas dos patrões o faz comportamentalmente cínico e
teatral. Sua técnica “profissional” e
de conduta é do sorriso fingido, completamente insensível aos enormes dramas
vivenciados pelos trabalhadores. Uma vez o escutei ao telefone oferecendo um
transformador desses de poste de rua para um trabalhador como indenização
oferecida pelo patrão. Perguntei-lhe o que o trabalhador faria com aquele lixo.
Respondeu-me: “deixa-o
pensar que aquilo presta para alguma coisa, assim nos livramos das dívidas
trabalhistas com ele”.
Esse advogado atua na justiça do trabalho em defesa dos patrões, completamente
esquecido de sua origem e da justiça social. Bem diferente de ti, minha amiga.
Agora se exibe pela mídia alguém que consegue
alcançar o ápice da traição, bem acima de várias medidas possíveis. Joaquim
Barbosa, presidente do STF consegue trair suas origens negras, pobres e a
democracia. Nesse sentido consegue ser negativamente genial. Poucas pessoas
conseguem trair triplamente como ele. Quando eu soube que Lula nomeara Joaquim
Barbosa por ser negro e de origem pobre para ser ministro do Supremo Tribunal
Federal, enchi-me de alegria. Quando o assisti acusando Gilmar Mendes de ser
cercado de jagunços no Mato Grosso pensei que contaríamos com um defensor da
justiça, dos pobres, dos negros e da democracia social. Ledo engano, triste
decepção com quem usurpa do poder e da história para trair o povo. Não entendo
como gente como Joaquim Barbosa e o advogado de Caxias do Sul conseguem
endurecer-se tanto ao ponto de se deixarem encantar pela mosca azul dos
traidores.
Feliz e abençoadamente temos a honestidade, a
coragem e a fidelidade de uma verdadeira advogada do povo e justa, a Ministra
do Supremo Tribunal do Trabalho, Delaíde Miranda Arantes. Essa não trai seu
povo nem suas origens. Pelo contrário, é um verdadeiro orgulho para nosso povo.
Ainda há esperança!
Abaixo posto entrevista que Delaíde Miranda
Arantes deu à Revista Isto É. É emocionante o que ela diz e nos enche de
esperança na luta de pessoas honestas e leais à justiça social, política e
econômica. Essa justiça transcende a “justiça” dos
ladrões e salteadores da boa fé.
Abraços críticos e fraternos na luta pela
justiça e pela paz.
Dom Orvandil: bispo cabano, farrapo e
republicano.
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DE DOMÉSTICA A MINISTRA
Ela trabalhou em lavouras e foi empregada na adolescência. Agora, como membro do Tribunal Superior do Trabalho, é figura-chave nas discussões da PEC das domésticas
Izabelle Torres e Josie Jeronimo
TRANSFORMAÇÃO
Delaíde tem nas mãos 12 mil processos e o desejo assumido de ajudar pessoas com biografia semelhante à sua
As discussões envolvendo a PEC das Domésticas, promulgada em abril pelo Congresso, colocaram luz sobre a atuação e a história de vida de uma ministra do Tribunal Superior do Trabalho (TST). Aos 60 anos, avó de três netos, Delaíde Miranda Arantes trabalhou nas pequenas lavouras do pai no interior de Goiás, foi empregada doméstica na adolescência e se tornou advogada aos 27 anos. No TST desde 2011, ela tem nas mãos 12 mil processos e o desejo assumido de ajudar pessoas com uma biografia semelhante à sua. Transformada em atração nacional depois da aprovação da emenda 72 – que regula o serviço doméstico -, seu gabinete virou um ponto de encontro de parlamentares, lideranças sindicais e assessores do Ministério do Trabalho interessados em debater a regulamentação da proposta. Na semana passada, entre uma audiência e outra, a ministra deu a seguinte entrevista para ISTO É:
ISTOÉ – A sra. foi empregada doméstica e ascendeu na carreira jurídica, em uma trajetória de superação que lembra a do presidente do STF, Joaquim Barbosa. Como avalia a atuação do ministro?
Delaíde Miranda Arantes – Eu não sou Joaquim Barbosa. Temos essa coincidência de trajetórias, mas não penso como ele. Tenho respeito. E tenho o dever hierárquico de respeito, porque ele comanda o Supremo. Entretanto, ele faz críticas à magistratura que eu não faria, pois não contribuem para alterar nada no Judiciário, especialmente pela forma como ele faz. O presidente do Supremo também critica advogados. Preocupam-me as declarações que ele fez ao ministro Ricardo Lewandowski durante o julgamento do mensalão. Eu não critico um colega que vota diferente de mim. Não acho que tenho esse direito. Eu realmente tenho uma preocupação com a forma como ele fala e como se coloca.
ISTOÉ – Qual o problema desse comportamento?
Delaíde – A impressão que tenho é que o presidente do STF pode ter amargura no coração. Às vezes faz discursos duros contra tentativas de defesa de réus. A gente não sabe por que faz isso. Quem sabe Freud possa explicar.
ISTOÉ – A sra. tem alguma amargura pelo sofrimento que passou?
Delaíde – Nenhuma. Sou liberada, meu coração é livre. Quando me formei em direito, minha carteira foi assinada por um sindicato de trabalhadores com um salário bem pequeno. Fui fazer um cadastro para comprar roupa a crédito e a moça falou: “Olha quanto ela ganha, por isso eu não estudo.” Uma vez fui arrumar emprego em Goiânia e uma das moças que moravam comigo numa república disse que eu não poderia trabalhar em escritório porque não tinha roupas. Na verdade, eu tinha duas roupas, dava para enganar. Um dia usava uma. No outro, a outra.
ISTOÉ – Seu passado como empregada doméstica a transformou em uma interlocutora de diversos setores nas discussões sobre a PEC 72. Como a sra. vê essas discussões?
Delaíde – A discussão é saudável. O Congresso está preocupado com a multa de 40% em caso de demissão. Faz sentido. Uma empresa tem uma rubrica financeira para as despesas trabalhistas. Quando o empregador é uma pessoa física, isso fica mais complicado. É importante pensar na criação de um fundo com participação do poder público, mas não tenho uma fórmula. Haverá uma solução e acho que ela não demora.
ISTOÉ – Os conflitos gerados pela PEC vão inundar a Justiça?
Delaíde – Em 1988, milhares de empresas disseram que iriam à falência em função de alguns direitos trabalhistas. Agora não temos empresas reclamando, mas empregadores dizendo que não podem mais ter empregadas, que não vai ser possível suportar. Mas o ônus não é tão grande. Está havendo um superdimensionamento. O ponto principal é tomar cuidado para não criar condições de questionamentos judiciais em demasia, em especial quanto às horas extras. O resto ainda será discutido. Aposto muito no diálogo entre empregada e empregador.
ISTOÉ – A PEC está sendo criticada porque foi aprovada sem prazo para regulamentação e sem recursos para cursos de profissionalização. A sra. concorda?
Delaíde – Considero que o apoio de políticas públicas será fundamental. Será necessário abrir creches, escolas infantis de tempo integral e até criar uma política de incentivo para a aquisição de casa própria para empregados domésticos.
ISTOÉ – Mas o governo não está conseguindo sequer cumprir as metas de construção de creches anunciadas antes da PEC…
Delaíde – Esta é uma demanda de muitos anos. Não é possível fazer tudo ao mesmo tempo. Acho que o setor privado terá que ajudar. Não é possível imaginar que só o setor público dará vazão a essa demanda.
ISTOÉ – A PEC é eleitoreira?
Delaíde – Na minha opinião, pode ter um componente desse tipo. Todo avanço social, em tese, rende votos. Não tem como se aprovar nada no campo social ou previdenciário que não se transforme de alguma forma em voto. Mas uma eleição é mais complexa e isso não vira voto diretamente. Quando for votar, a empregada não vai escolher alguém apenas porque aprovou uma emenda. Se houver vantagem eleitoral, será indireta.
MÉRITO
Delaíde nunca foi petista, mas admira o trabalho de Lula no governo
ISTOÉ – A Justiça do Trabalho mudou de perfil nos últimos anos?
Delaíde – Não há dúvida. É uma mudança que reflete as transformações recentes do Brasil. Elas permitiram que uma antiga empregada doméstica, como eu, fosse nomeada ministra do TST. Há alguns anos, isso seria quase impossível. Mas hoje somos um País preocupado com a pobreza. Isso se reflete no trabalho da Justiça e amplia o leque de quem conhece seus direitos e busca por eles. O Brasil presidido por um metalúrgico e depois por uma mulher não é o mesmo País de antes.
ISTOÉ – A sra. é petista?
Delaíde – Nunca fui petista, mas fui comunista por mais de 20 anos. Era uma militante de base do PCdoB, com um papel secundário no partido. Fui diretora da OAB, da associação dos advogados trabalhistas de Goiás e até hoje estou filiada à associação das mulheres de carreira jurídica. Eu me desfiliei para atender à lei da magistratura nacional. Também me desvinculei porque gosto de ser séria em tudo o que faço.
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