Paulo
Nogueira 4 de dezembro de 2012
Como
Joaquim Barbosa se mexeu nos bastidores do ‘poder dominante’ para enfim chegar
ao STF
Barbosa
em seu primeiro discurso no STF
Estou em Londres há quatro anos já, e existem
algumas coisas no Brasil que agora, com a temporada europeia, me chamam a
atenção. Talvez no passado eu achasse tudo normal.
Por exemplo, as linhas abaixo, extraídas do
dircurso se posse de Joaquim Barbosa na presidência do STF:
Por fim, eu gostaria de arrematar esta breve
exposição com umas poucas palavras sobre um personagem chave para toda e
qualquer tentativa que se queira implementar no nosso país na esfera do Poder
Judiciário. Falo da figura do juiz, esta figura tão esquecida, às vezes. É
preciso reforçar a independência Juiz. Afastá-lo desde o ingresso na carreira
das múltiplas e nocivas influências que podem paulatinamente lhe minar a
independência. Essas más influências podem se manifestar tanto a partir própria
hierarquia interna a que o jovem juiz se vê submetido, quanto dos laços
políticos de que ele pode às vezes se tornar tributário na natural e
humana busca por ascensão funcional e profissional. Nada justifica, a meu
sentir, a pouco a edificante busca de apoio para uma singela promoção do juiz
do primeiro ao segundo grau de jurisdição. O juiz, bem como os membros de
outras carreiras importantes do estado, deve saber de antemão quais são as suas
reais perspectivas de progressão, e não buscar obtê-las por meio da
aproximação ao poder político dominante no momento.
É uma frase diante da qual eu me inclinaria a dar
um clássico clap, clap, clap. De pé.
Mas e quando você examina o caminho percorrido por
Barbosa até chegar ao discurso triunfal?
Recapitulemos.
O acaso, em parte, lhe deu um abraço, registrado
num livro de memórias de Frei Betto, grande amigo de Lula e figura influente em
seu primeiro mandato. O nome do livro é Calendário do Poder.
“Fui lá tratar do meu retorno a São Paulo, após a
posse presidencial”, revela um trecho do livro Calendário do Poder. Era 2002, e
Frei Betto fora a uma agência da Varig em Brasília para comprar uma passagem de
avião depois da posse de Lula. A fila era grande, e então ele pegou uma senha e
procurou um lugar para sentar.
Palavras de Frei Betto, tiradas de Calendário do
Poder:
Instalei-me no primeiro banco vazio, ao lado de um
cidadão negro que nunca vira.
- Você é o Frei Betto? – indagou-me.
Confirmei. Apresentou-se: Joaquim Barbosa… Trocamos
ideias e, ao me despedir, levei dele o cartão e a boa impressão.
Para concluir…
Em março, Márcio Thomaz Bastos [então ministro da
Justiça]indagou se eu conhecia um negro com perfil para ocupar vaga no STF.
Lula pretendia nomear um para a suprema corte do país. Lembrei-me de Joaquim
Barbosa”.
Não está em discussão aqui se a intenção de Lula
era promover a causa negra ou se era era um simples gesto demagógico. Mas não
há como fugir do fato de que Lula simplesmente inventou Barbosa, e é curioso
ver como muitos dos comentaristas que o louvam hoje pelo desempenho no
julgamento do Mensalão receberam a bordoadas sua indicação.
Voltemos à caça de apoio empreendida por Barbosa,
não tão diferente assim da jornada épica de Luiz Fux rumo ao topo.
Podemos atribuir o encontro na Varig à fortuna.
Barbosa não podia saber que o destino poria Frei Betto em condições de ser
abordado. Talvez pudéssemos dizer, se fôssemos mais rigorosos, que a julgar
pelo parágrafo destacado em seu discurso ele não devesse ter se aproximado de
Frei Betto – representante do “poder dominante” — e dado um cartão.
Mas podemos estar sendo rigorosos demais, numa
situação dessa natureza.
Então, passemos adiante.
E quando o acaso não ajuda?
Aparentemente, não foi apenas de Frei Betto que
Barbosa recebeu a bênção.
Segundo uma reportagem da repórter Maria Lima,
publicada dias atrás no Globo, Barbosa procurou — como o ministro Luiz Fux —
José Dirceu no esforço de ser indicado para o STF. Na reportagem, Maria
Lima entrevistou um dos mais conhecidos advogados de Brasília, Antônio Carlos
de Almeida Castro, conhecido como Kakay.
“Ele me procurou e disse que era um sonho seu
chegar ao Supremo e que precisava do apoio do Zé Dirceu”, disse Castro à
jornalista do Globo. Segundo Castro, Dirceu topou receber Barbosa depois de
dizer que era necessário mudar a “forma de indicação dos ministros do Supremo”.
Barbosa acabaria sendo indicado por Lula, em 2003.
Voltemos a um trecho de seu primeiro discurso como
presidente do Supremo.
O juiz, bem como os membros de outras carreiras
importantes do estado, deve saber de antemão quais são as suas reais
perspectivas de progressão, e não buscar obtê-las por meio da aproximação
ao poder político dominante no momento.
Algumas pessoas ligaram essa sentença à louca
cavalgada do juiz Luiz Fux rumo ao STF. Mas Barbosa poderia, aparentemente,
estar falando de experiência própria.
Lula está sendo – merecidamente, aliás – cobrado a
dar explicações sobre o caso Rosemary. E Barbosa, deveria também explicar
melhor seus passos?
Sobre o julgamento do mensalão, conforme já foi
escrito no Diário, provavelmente apenas a posteridade terá uma ideia mais
objetiva e menos apaixonada sobre os acontecimentos.
Caixa Dois? Dinheiro público? Provas
estarrecedoras? Apenas indícios? Mensalão ou AP 470?
As verdades se alteram rapidamente de acordo com
quem está com a palavra. O certo é que o STF necessita de uma reforma urgente –
e o caminho percorrido por Barbosa, e descrito por ele mesmo em seu discurso, é
uma lembrança cruel disso.
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