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Medo do desemprego já deixa trabalhadores à deriva


23 DE JANEIRO DE 2009 - 18h37
Nos olhos de Ailton da Cruz, 37 anos, está o sentimento de milhares de trabalhadores brasileiros. O medo do desemprego e as incertezas sobre o futuro rondam operários de norte a sul que, em 2009, sentiram com mais força os efeitos da crise mundial. “É horrível. A gente vê os colegas indo embora e não pode fazer nada”, lamenta. Cruz é metalúrgico e há 18 anos trabalha na Olimpus, em São Paulo, empresa com cerca de 400 funcionários, fornecedora de autopeças para GM, Volkswagen e Fiat.

Por Priscila Lobregatte*


A crise vai se estendendo mundo afora numa espécie de efeito dominó. O jogo sujo do cassino financeiro norte-americano resultou em problemas sérios em todos os setores da economia, especialmente na área da produção. Aqui, os principais efeitos foram sentidos a partir do final de 2008. E, como sempre, quem paga a fatura da festa da especulação são os trabalhadores, especialmente os dos países em desenvolvimento, como o Brasil.

Recentemente, a GM de São José dos Campos demitiu 744 funcionários e outros 1.600 estão ameaçados na fábrica de São Caetano do Sul. Em todo país, 28,3 mil metalúrgicos foram demitidos e destes 16 mil eram do setor de autopeças.

Na empresa onde trabalha Ailton da Cruz não foi diferente. “Cem colegas foram pra rua desde outubro. Não deu para evitar. Mas fizemos agora uma paralisação de dois dias e com isso conseguimos ao menos a garantia de que os demitidos terão seis meses de cesta básica e de assistência médica, além de uma ajuda de custo de R$ 600”, explica.

As expectativas de Cruz não são boas. Com dois filhos para criar e a esposa também trabalhando na empresa, o operário tem economizado e cortado despesas onde pode porque já não sabe como será o amanhã. “O Natal e o Ano Novo foram dias normais e sequer pude comprar presentes para as crianças”, conta. “Me sinto à deriva porque mesmo empregado, sei que não há nenhuma garantia de estabilidade. Os trabalhadores precisam se unir porque só com a nossa mobilização conseguiremos reverter esse quadro”, diz.

Desilusão

Acácio Ferreira, 19, morador da periferia de Itu, no interior paulista, é um dos jovens trabalhadores que viram seus sonhos interrompidos pelos resultados da crise internacional. Ex-funcionário da Caldlaser, indústria de caldeiraria que fornece peças para montadoras, Cau, como é conhecido, não teve tempo sequer para desfrutar dos benefícios de um trabalhador de carteira assinada. Admitido como temporário dia 3 de novembro, teve o contrato suspenso dia 14 do mesmo mês. “Primeiro disseram que iam precisar de mais gente, nos chamaram e, em duas semanas, mandaram quatro embora. Tudo mudou de repente e argumentaram que foi por causa da crise”, conta.

Ele é um dos 5.100 funcionários da área metalúrgica automotiva que perderam seus empregos desde novembro somente em São Paulo. Filho de pai ceramista e mãe dona de casa, Cau contribuía com parte importante do sustento da casa. “O duro é que a gente faz planos. Queria continuar os cursos na área, pensava em progredir na empresa, estava animado e agora tenho que fazer cortes para poder dar conta do essencial”, diz. “Fiquei muito deprimido. Me escondi no vestiário da empresa e chorei, me senti sem rumo. O pior foi contar para minha mãe”, lembra.

O sentimento de Cau já foi estudado por pesquisadores da área. No livro “Trabalho e Autonomia”, o professor Antonio Cattani trata do sentimento de deriva pelo qual passam aqueles que estão desempregados. O trabalho, explica, é “essencial para a construção de identidade e socialização e a principal, ou a única, maneira de se obter recursos materiais e imateriais necessários à vida”. E, quando falta o trabalho, o indivíduo se sente excluído, sem domínio sobre os rumos de sua própria vida. O movimento do desemprego no sistema capitalista, segundo Cattani, “irá recuperar alguns, ‘afogar’ outros tantos e jogar para a margem a maioria”.

Luta necessária

É contra esse afogamento em massa que governo, centrais sindicais e trabalhadores têm lutado. Por todo país, espalham-se paralisações e passeatas contra as demissões. “Estamos mobilizando a categoria e a sociedade em defesa do emprego e dos salários. Existe a crise, mas há empresas que fazem pressão sobre a categoria para reduzir o ordenado e os direitos dos trabalhadores. Não podemos compactuar com isso”, protesta Assis Melo, presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de Caxias do Sul e Região. Somente nesta cidade gaúcha, houve no final de 2008 cerca de 7.500 demissões no setor metalúrgico.

Assis explica ainda que a crise enfraquece o poder de negociação dos trabalhadores. “Dialogar com patrão é sempre difícil em tempos de crescimento; em períodos de crise é ainda pior porque o medo do desemprego dificulta a mobilização. A crise diminui o poder de barganha dos trabalhadores”.

Para ele, além da união dos trabalhadores, é preciso que o Brasil ponha em prática um projeto de desenvolvimento de longo prazo. “Hoje, um dos caminhos para enfrentar a crise está no aumento de investimentos em áreas estratégicas, como a de infra-estrutura. Construindo casas populares, estradas, portos e melhorando os transportes estaremos criando novos postos de emprego e preparando o país para crescer em melhores condições”, argumenta.

Na Bahia, a situação também se complica. Apenas no setor metalúrgico, houve 1.500 demissões entre novembro e dezembro, segundo Aurino Pedreira Filho, da direção da Federação dos Metalúrgicos da Bahia. “Estamos resistindo e conseguimos ao menos um acordo que garante os postos dos trabalhadores até março”, diz. Por outro lado, criticou, “as empresas têm feito de tudo para flexibilizar os direitos e tentar diminuir os salários e isso não é justo já que, nos últimos anos, as empresas faturaram muito inclusive em produtividade”.

Aurino reforça que neste momento é urgente uma queda maior na taxa de juros para estimular a economia interna. “O governo vem tomando medidas tributárias importantes, mas deve também exigir, como contrapartida, a manutenção dos empregos”. Neste sentido, o Ministério da Fazenda já planeja avaliar a situação financeira das empresas e definir como critério para empréstimos a não demissão dos funcionários.

De acordo com o sindicalista, “agora é hora de investir tanto o capital privado quanto o público e aumentar o controle sobre o sistema financeiro e sobre as remessas de lucro para o exterior”. Do ponto de vista da mobilização dos trabalhadores, Aurino reforça: “temos de levar adiante uma agenda comum de lutas que envolva todas as centrais sindicais. A crise exige uma ampla mobilização dos trabalhadores e de toda a sociedade”.

*para jornal Classe Operária, edição de fevereiro (http://www.vermelho.org.br/)

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