Boff: Ambiguidades marcam a história de Ratzinger
Agência Brasil
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"Uma coisa é o Ratzinger professor e acadêmico,
que era extremamente gentil e inteligente, além de amigo dos estudantes. Dava
metade do salário aos estudantes latinos e da África. Outra coisa é o Bento
XVI, que exerce função autoritária e centralizadora, sem misericórdia com
homossexuais e [adeptos da] camisinha", analisa o teólogo e professor
universitário Leonardo Boff
11 de fevereiro de 2013.
Por Pedro Peduzzi
Repórter da Agência Brasil
Brasília - Apesar de serem a mesma pessoa, Joseph
Ratzinger e o Papa Bento XVI eram duas personalidades diferentes. A opinião é
do teólogo e professor universitário Leonardo Boff, um dos poucos brasileiros
que conviveram com o líder católico que anunciou hoje (11) o fim de seu
pontificado. Ex-integrante da ordem franciscana e um dos expoentes da Teologia
da Libertação no Brasil, Leonardo Boff falou à Agência Brasil sobre o papa
Bento XVI "de função ambígua e polêmica" e de atitudes rígidas.
"Uma coisa é o Ratzinger professor e
acadêmico, que era extremamente gentil e inteligente, além de amigo dos
estudantes. Dava metade do salário aos estudantes latinos e da África. Outra
coisa é o Bento XVI, que exerce função autoritária e centralizadora, sem
misericórdia com homossexuais e [adeptos da] camisinha", disse Boff.
O teólogo define Ratzinger da fase pré-papal como
um pastor e professor extremamente erudito e de fácil acesso. "Era pessoa
simples que, ao se tornar cardeal, mudou de comportamento e passou a assumir
posições duras.Tratava com luvas de pelica os bispos conservadores e com
dureza teólogos da libertação que seguiam os pobres".
Segundo Boff, dois aspectos caracterizaram o
Ratzinger da fase posterior. "Primeiro, o confronto com a modernidade, no
encontro com as culturas e com outras religiões. Tinha a compreensão de que a
Igreja Católica era o único porta-voz da verdade, e a única capaz de dar rumo a
toda humanidade. Por isso, teve dificuldades com muçulmanos e judeus".
O segundo aspecto tem origem à época em que era
cardeal. "Ele pedia aos bispos que impedissem que padres pedófilos fossem
levados aos tribunais civis. Na medida em que a imprensa mostrou que havia não
apenas padres, mas também bispos e cardeais suspeitos dessa prática, o Vaticano
teve de aceitar a realidade. Ratzinger carrega essa marca de, quando cardeal,
ter sido cúmplice desses crimes", declarou Boff.
Na avaliação do ex-franciscano, outro ponto fraco
da atuação de Bento XVI como maior líder da Igreja Católica foi o de levar um
papado tradicional, voltado para dentro da Europa. Na opinião de Boff, o papa
construiu "uma igreja baluarte: fortaleza cercada de inimigos por todos os
lados", e contra os quais tinha de se defender.
"Acho que o projeto dele era uma reforma da
igreja ao estilo do passado, voltada para dentro e tendo como objetivo político
a reevangelização da Europa. Nós, fora de lá, consideramos esse projeto como
ineficaz e como opção pelos ricos. Projeto equivocado", argumentou.
"Não é um papa que deixará marcas na história".
Boff disse não ter recebido com surpresa a notícia
de que o Papa Bento deixará o posto, e que já sabia que ele vinha tendo
problemas de saúde que o comprometiam física e psicologicamente para exercer o
ofício.
"Recebo com naturalidade essa notícia. Essa
decisão segue sua natureza objetiva. Não é praxe um papa renunciar. Ele
desmistificou a figura do papas, que geralmente ficam [no cargo] até morrer.
Provavelmente por entender o papado como um serviço. Essa atitude merece toda
admiração e respeito. Esperamos, agora, que até a Páscoa, em meados de março,
elejam um novo papa. De preferência um papa mais aberto. Até porque 52% dos
católicos vivem no terceiro mundo e não mais na Europa", completou.
[Edição: José Romildo].
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