Querida Elisângela
Gostei tanto de conversar contigo ontem na Faculdade Delta.
Senti enorme alegria por trabalharmos juntos na educação há alguns semestres,
tu na condição de aluna e eu de professor, ambos como buscadores da verdade que
humaniza.
Senti tanta alegria e aproximação em nossa conversa ao ponto
de contares comigo como teu confidente ao relatares conflitos importantes com
uma amiga que se revelou interesseira e traidora de tua confiança e do quanto
tal relacionamento decepcionante repercutiu negativamente na relação com tua
mãe. Logo em seguida, até pelo fato de eu ser gaúcho e de ter trabalhado,
lutado e morado em Santa Maria – RS, nossa conversa se derivou para a tragédia
provocada pela falta de respeito à vida humana, sempre promovida pelo capitalismo
voraz e esfomeado de lucros, da qual foram vítimas mais de 300 jovens e seus
familiares, até agora matando 235 dos participantes da festa que virou incêndio.
Minha tristeza, depois de nossa conversa sobre os fatos da boate Kiss, em
contraste do que falávamos antes, foi
tão forte que uma amiga minha, ao me ver depois, se espantou com meu estado de
luto.
Então, querida amigo Elisângela, seguidamente escrevo aqui
que esse blog não é jornalístico nem sou jornalista. O objetivo deste espaço,
como reza no template, é “denunciar o imperialismo, a direita e as injustiças;
anunciar sinais de justiça e libertação nos países e nos povos”. Aqui refletimos o que as notícias e os
jornalistas não refletem. Criticamos arduamente as barbáries praticadas contra
as pessoas, principalmente contra trabalhadores/as e os/as pobres. Porém, pinçamos
no meio do inferno os generosos sinais de mudanças, de humanização e de
justiça. É nesse sentido que recolho abaixo uma notícia que mostra a força do
amor que se levanta da fumaça e das chamas assassinas para sinalizar o quanto a
beleza da relação de um homem e de uma mulher é capaz de ser construtiva e
artística. Uma capitã médica do Exército Brasileiro morreu junto ao homem que
amava, exatamente pela paixão que os unia e pela dança através da qual o
capitalismo os empurrou para a morte.
Apesar da tragédia, apesar da ganância empresarial de quem
faz negócios com as vidas humanas, Daniele e Herbert, testemunham que o amor
jamais se asfixia, tal é o seu poder catalisador e libertador. É arrepiante
colher tal preciosidade do meio da catástrofe. Vejo tantas pessoas mediocrizando o amor e
interpondo milhões de obstáculos para entregar-se ao outro. A internet é
veículo de tantas ameaças de falta de amor e tantos crimes se comentem por
falta do amor. Tantos casais feitos um para o outro perdem oportunidades de ser
e de fazer felizes os outros, por medo e por entraves preconceituosos, até
mesmo diferenças de idades e de condições econômicas. Tantos, principalmente
mulheres, deixam a felicidade torrencial passar porque se deixam enrolar e desviar
por preconceitos e obstáculos bestas familiares. Pois do “Coração do Rio Grande”,
como é chamada Santa Maria, ergue-se
altissonante o testemunho de Daniele e Herbert, os anjos do amor. Consigo
imaginá-los dançando de amor.
Abraços críticos e fraternos, sem desistir da luta pela
justiça e pela paz, jamais.
Dom Orvandil: bispo cabano, farrapo e republicano.
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Volta de carioca ao Rio foi adiada para curtir o noivo
Apaixonada por dança e pela vida, capitã do Exército transferiu passagem a fim de aproveitar mais uma noite ao lado do companheiro. Casal morreu asfixiado
POR Felipe Freire
Rio -
A paixão pela dança e a vontade de curtir mais uma noite das férias com
o noivo em Santa Maria (RS) selaram o destino da carioca Daniele Dias
de Mattos, de 36 anos, e de Herbert Charão, 27. O casal, que transferiu
de sábado para segunda-feira o retorno ao Rio, morreu intoxicado pelo
incêndio na boate Kiss. O corpo da capitã médica do Exército será
enterrado hoje no Cemitério de Inhaúma, Zona Norte carioca.
Daniele e Herbert procuravam casa para comprar. Eles se conheceram há mais de quatro anos | Foto: Reprodução da Internet
“Era um casal apaixonado, que gostava das mesmas coisas. Ela voltaria a
trabalhar na terça-feira (ontem) e por isso decidiu não seguir no
sábado para Porto Alegre, onde pegaria o voo para o Rio. A vontade dela
era apenas dançar. Acabou morrendo”, contou Denise Rios, vizinha de
Herbert em São Sepé (RS), onde ele morava.
Segundo amigos do casal, em março deste ano ela iria pedir
transferência para Santa Maria e, junto do futuro marido, já procurava
casa para comprar. Eles se conheceram há mais de quatro anos na cidade
onde ocorreu a tragédia, durante aulas de dança ministradas pelo próprio
Herbert. A carioca, que trabalhou de 2006 a 2011 nos hospitais de
Guarnição e Universitário antes de seguir para o Hospital Central do
Exército, em Benfica, era apaixonada por tango.
Daniele chegou a São Sepé, que fica a cerca de 60 km de Santa Maria, no
dia 31 de dezembro de 2012. Acompanhada da filha, Ana Carolina, 14, que
passou alguns dias no município e depois seguiu com o avô para uma
viagem ao exterior, passou as férias fazendo passeios, curtindo festas e
reencontrando amigos e antigos pacientes.
“Ela gostava tanto de dançar que, além de coordenar o Projeto
Revicardio, um trabalho voluntário para prevenção de doenças
cardiovasculares, também dava aula de dança com o Herbert para os
pacientes. São perdas irreparáveis", completou Denise.
Primeiro tenente Leonardo Machado de Lacerda é velado no Rio | Foto: Maíra Coelho / Agência O Dia
O corpo de Daniele chegou ao Rio na madrugada de ontem e seguiu para o
Hospital Central do Exército, em Benfica, onde foi velado por parentes e
amigos nas primeiras horas do dia. Muito abalada, a mãe da capitã,
Maria Cristina, pediu que o caixão fosse aberto.
“Parece que ela está dormindo, com a mesma carinha de sempre”, contou
um amigo. Hoje pela manhã, o corpo seguirá para o Cemitério de Inhaúma,
onde será sepultado por volta das 14h de hoje. Até ontem, parentes
aguardavam a chegada da filha e do pai da vítima, que retornavam de
viagem. “Daniele era alegre, para frente. No pessoal, uma pessoa
humilde. No trabalho, tratava os pacientes como amigos", completou
Isabel.
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